quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

O menino e o presente de Natal!


Há alguns anos, eu trabalhava em uma agência de marketing direto na área de atendimento. Apesar de gostar do que eu fazia e adorar meus colegas/amigos de trabalho, eu tinha uma grande insatisfação dentro de mim. Minha alma sentia falta de fazer algo que pudesse ajudar o Mundo a ser um lugar melhor.
Como não sou uma pessoa rápida para tomar decisões, passei alguns meses infernizando meus colegas. Até que tudo fez sentido. Lembro-me do exato momento em que tomei a decisão de pedir demissão.  Eu não sabia o que eu queria fazer, mas eu tinha total convicção que eu não queria mais fazer aquilo.
Como eu estava desempregada, sem saber o que fazer, comecei a pesquisar, ler, conversar com as pessoas, e finalmente, achei algo que fez meu coração acelerar: marketing cultural. Graças a vários acasos lindos do destino, lá fui eu fazer a produção local do Natal do HSBC.  E por meio do marketing cultural, conheci o marketing social e me apaixonei.
Naquela época, há mais de 10 anos, não sei como é hoje, as crianças que cantavam nas janelas eram crianças de lares e projetos de Curitiba, algumas afastadas dos pais por medidas de segurança. Crianças carentes – não apenas de bens materiais, mas de atenção, carinho, oportunidades. Com a convivência de meses, por causa dos ensaios, passei a conhecê-las. Eram 140 crianças, conhecia a maioria pelo nome. Algumas, as mais falantes, conhecia além do nome, a história de vida. 
Após duas apresentações em que tudo correu bem, pude assistir, como expectadora, ao espetáculo. E ao olhar para a janela e reconhecer cada rostinho e suas respectivas histórias de vida, não me contive e comecei a chorar. Naquele momento, percebi que meu trabalho havia, direta ou indiretamente, impactado a vida daquelas crianças. Imagina o que receber atenção, educação musical, oportunidades, aplausos e carinho, fazia à autoestima daquelas crianças!
Foi aí que entendi que poderia tocar a vida das pessoas com o meu trabalho. Mas o senso de responsabilidade que tocar a vidas das pessoas tem, só percebi alguns dias depois, na última apresentação. O clima estava ótimo, o sentimento de dever cumprido, as despedidas carinhosas, recebi bilhetes e cartinhas das crianças; na maioria, crianças que eu conhecia mais, aquelas mais falantes. 
Até que um menino que eu nunca havia conversado, daqueles meninos quietinhos que parecem pedir desculpas por estar ali no mundo, sabe?  Este menino se aproximou de mim, e timidamente, me entregou um cartão. Em seguida, sumiu no meio das outras crianças.
Mantenho até hoje o cartão comigo, como um lembrete. Um amuleto, talvez. Algo que me faz refletir sobre a responsabilidade que temos no mundo. Mesmo sem perceber, podemos tocar a vida de alguém, mesmo sem intenção.  Percebi o poder que isso tem, e como todo poder, traz muita responsabilidade.

O singelo cartão, escrito a lápis, me comove até hoje.  Não tive a oportunidade de agradecê-lo. Querido Rogério, de onde você estiver, receba meu carinho e retribuição por um gesto tão lindo! Muito obrigada, você, mesmo sem saber, me ensinou muito. 

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Vocês não contavam com a minha astúcia!


Além da tristeza de ver pessoas tão geniais partindo em 2014, fico com uma grande questão em aberto: será que pessoas tão geniais estão chegando também?
Quando Rubem Alves partiu, fiquei com uma tristeza engasgada, queria ter enviado para ele um exemplar da Fada de Botas, na apresentação do livro cito a seguinte frase: Como disse Rubem Alves, devemos ensinar as crianças a amar os livros. Queria ter compartilhado com ele um pouquinho da história da fada, e de como ela está espalhando amor aos livros por ai. Mas, por motivos tolos, acabei não enviando o livro a ele ... e ele partiu. Choro engasgado.
Quando vi Manoel de Barros partir  ... chorei solto e me senti  órfã e mais solitária no mundo. Eu não o conhecia, e mesmo assim, eu sabia que ele me entendia. Eu me entendia quando lia suas palavras.  Tive uma tristeza regional, pelo poeta da minha terra. E nesse caso há duas interpretações possíveis para esse regionalismo. Manuel vivia em Campo Grande, onde também estão minhas raízes. Mas, além e, sobretudo, ele vivia nas terras das palavras e dos sentimentos que compartilho. Orfã duas vezes. Quem agora poderá traduzir esse sentimento de carregar água com peneira que é o ato de escrever? Com quem vou compartilhar o gosto pelas coisas desimportantes? Dou graças a Deus, que poetas são eternos e que escrever é uma forma de ficar para sempre. Choro de rios de lágrimas desinúteis...
Ainda nem havia me recuperado desta perda, e Bolaños  resolve partir também. Não estou comparando em importância e arte essas pessoas que cito aqui, só estou compartilhando meus sentimentos.  Chaves tinha a inocência da criança. Chaves fazia rir. Chaves teve o poder de contagiar várias gerações com sua graça non sense. É a arte com o poder de romper fronteiras. Depois de assistir no cinema a biografia do genial Cantinflas, entendi melhor o humor do Bolaños. E me entristeci com sua partida. Lágrimas da criança que se escondia no armário, como se ali fosse um barril. Lágrimas de criança que ficou sem o doce.
Volto, então, para minha pergunta inicial: será que estão chegando a esse Mundo pessoas tão geniais quanto as que estão partindo?
O prêmio Nobel da Paz para Malala, a menina de 17 anos, me diz que sim. Após ler sobre sua história de vida, com apenas 17 e já capaz de mudar o destino de tanta gente, lágrimas de esperança escorrem pelo meu rosto.

Chego a ouvir Deus lá de cima parafraseando o Chapolin Colorado:

- Vocês não contavam com a minha astúcia!!!!





*obrigada Armandinho por traduzir tão lindamente essas desimportâncias.